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Desoneração, seguridade social e indicadores econômicos

Escrito po: Eduardo Fagnani

21/05/2013

O ciclo de crescimento recente esteve ancorado na ampliação do mercado interno de consumo de massas, impulsionado pelo incremento da renda das famílias.

 

"O ciclo de crescimento recente esteve ancorado na ampliação do mercado interno de consumo de massas, impulsionado pelo incremento da renda das famílias. A geração empregos formais e a valorização do salário mínimo foram fatores determinantes, complementados pelas transferências monetárias da Seguridade Social e do programa Bolsa Família.

A importância da Seguridade Social no progresso social recente e na ativação da demanda agregada não tem sido devidamente sublinhada no debate atual. Observe-se que, entre 2001 e 2012, o total de benefícios diretos da Seguridade passou de 24 para 37 milhões. A cobertura atual supera 110 milhões de pessoas, se também forem contabilizados os benefícios indiretos (membros da família). Em 2012 os benefícios diretos contemplavam a Previdência Urbana (17,2 milhões), a Previdência Rural (8,7 milhões), o Seguro-Desemprego (7,5 milhões) e a Assistência Socia l (4 milhões). Mais de dois terços desses benefícios correspondem ao piso e a agressiva política de valorização do salário mínimo elevou a renda desse contingente em mais de 70% acima da inflação.  Estudos do IPEA revelam que entre 2001/2011 a Seguridade Social contribuiu com 23% para a queda da desigualdade medida pelo índice de Gini. No subperíodo 2009/2011, no entanto, “pela primeira vez, os rendimentos da previdência apresentaram a maior contribuição” para a queda do Gini (55%), superior à contribuição do mercado de trabalho.

A Seguridade Social brasileira inspirou-se na experiência europeia do pós Guerra (1945/73) marcada por políticas econômicas visando ao pleno emprego e instituições do Estado de Bem-Estar. A Constituição de 1988 procurou articular políticas de saúde, previdência, assistência social e proteção ao trabalhador desempregado e assegurar fontes adequadas de financiamento para o seu desenvolvimento. De forma correta, os constituintes se inspiraram no modelo tripartite clássico de financiamento do Welfare State. O Orçamento da Seguridade Social vincula constitucionalmente fontes contributivas sobre a folha de salários (empregadores e trabalhadores) e impostos gerais (governo). Nesse caso, foi instituída a Contribuição sobre o Lucro Líquido (CSLL) e a Contribuição sobre o Faturamento (COFINS) e parte dos recursos do PIS/PASEP passou a financiar o Seguro Desemprego. 

Entretanto, esta base de financiamento poderá ser corroída pela agressiva política desonerações em curso.  O governo tem adotado medidas corretas voltadas para a reativação do crescimento e ampliação da competitividade da indústria nacional. Destaca-se, especialmente, a queda dos juros básicos, a desvalorização cambial, redução dos spreads dos bancos públicos e a queda do custo de energia.

Com o mesmo objetivo, no entanto, abriu uma frente controversa. Parte da perda da competitividade da indústria seria derivada do custo do trabalho. Argumentos semelhantes foram rechaçados no passado por diversos especialistas que alertavam para o fato de que os salários são cronicamente baixos no Brasil e os encargos sociais estavam em linha com parâmetros internacionais. Outro ponto polêmico é a alegação de que as desonerações impulsionariam o emprego e a formalização.

A estratégia de redução dos custos trabalhistas desobrigou 42 setores econômicos do pagamento da contribuição patronal de 20% sobre a folha salarial para a previdência. Informações da imprensa revelam que nos próximos dias o governo deve sancionar medida provisória que amplia a desoneração para 75 setores.

Para compensar as renúncias previdenciárias foi ampliada a contribuição das empresas sobre o faturamento (adicional de 1% a 2% da COFINS sobre Importações). Todavia, essa compensação é parcial. O impacto fiscal da medida é incerto. O Ministério da Fazenda estima que em 2013 as renúncias previdenciárias cheguem a R$12,9 bilhões – número inferior ao estimado pelo Ministério da Previdência (R$ 16 bilhões).

Embora o regime possa ser alterado no início de cada ano fiscal, dificilmente ele será revertido. O agravamento do alegado “déficit” da previdência realimentará as pressões das forças do mercado por novas rodadas de supressão de direitos. A manutenção do regime exigirá maior participação do governo.

A ampliação das transferências fiscais mitiga, mas não resolve o problema. Paralelamente será necessário alterar a forma como as isenções previdenciárias são aferidas pela contabilidade oficial, que não considera as renúncias fiscais pretéritas como parte das receitas da Previdência Social.

Observe-se que, em agosto de 2012, a imprensa repercutiu da seguinte forma a nota divulgada pelo Ministério da Previdência e Assistência Social (MPAS) sobre os resultados financeiros da Previdência no primeiro semestre desse ano:

“No acumulado do ano até julho, o déficit da Previdência já soma R$ 23,450 bilhões. O rombo é 1,8% maior do que o verificado em igual período de 2011, de R$ 23,035 bilhões. De janeiro a julho deste ano, a Previdência arrecadou R$ 149,934 bilhões e teve despesas com benefícios no total de R$ 173,384 bilhões” .

Os dados demonstram que, caso as renúncias fiscais fossem contabilizadas como receitas (transferência da União), o mencionado “rombo” de R$ 23,4 bilhões acumulados entre janeiro e julho seria reduzido para R$ 9 bilhões. Ademais, esse chamado “rombo” não considera que as despesas previdenciárias também são financiadas pelas demais fontes que compõem o Orçamento da Seguridade Social. 

Para as novas desonerações o Ministério da Fazenda afirma que “a União compensará qualquer perda de arrecadação previdenciária com recursos do Tesouro”. Essa compensação tem algum respaldo na Lei 12546/11. Mas esse amparo é insuficiente, pois não corrige o passado e deixa dúvidas sobre o futuro.

Deveríamos caminhar para a promulgação de legislação específica que inclua a rubrica “transferências da União para compensação de renúncias previdenciárias” como fonte de receita da Previdência Social. Essa nova forma deveria dar conta das renúncias pretéritas, atuais e futuras.

O ponto de partida deveria ser a recuperação das propostas tentadas pelo MPAS em 2007. O então ministro Nelson Machado passou a defender mudanças na contabilização oficial que embutiam no “déficit” renúncias fiscais que não tinham relação com a previdência. "São políticas públicas do governo que não deveriam ser suportadas pela Previdência", afirmou.  Na sua visão, “as renúncias com o Simples (R$ 4,8 bilhões), com entidades filantrópicas (R$ 4,16 bilhões) e com a exportação da produção rural (R$ 1,85 bilhões) deveriam entrar na conta do Tesouro Nacional e não da Previdência”.

A disposição do ministro era editar legislação específica obrigando o Tesouro Nacional a ressarcir a Previdência pelas perdas apuradas: "Cabe aos ministérios da Fazenda, do Planejamento e da Casa Civil propor alterações legais para reduzir as isenções. Não foram eles que coordenaram as desonerações no PAC [Programa de Aceleração do Crescimento]?”.

Todavia, com a saída de Machado do MPAS, esses esforços foram abandonados. A “mudança contábil” realizada apenas discriminou as isenções previdenciárias e separou as receitas e despesas dos segmentos rural e urbano.

Em suma, as desonerações patronais limitam as bases de financiamento da Seguridade. Será preciso ampliar a contribuição fiscal do governo. Mas isso não resolve a questão. Também será necessário alterar o critério de contabilização adotado pelo MPAS. O ponto de partida deveriam ser as propostas elaboradas pelo governo em 2007."

 professor Eduardo Fagnani, do Instituto de Economia da Unicamp, pesquisador do CESIT (IE/Unicamp) e coordenador do núcleo Plataforma Política Social, publicado no portal Rede Previdência, em 18/04/2013

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