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CNTSS > ARTIGOS > A SAÚDE PÚBLICA AGONIZA E OS GRUPOS PRIVADOS TOMAM SEU LUGAR

A saúde pública agoniza e os grupos privados tomam seu lugar

Escrito po: Milton Kempfer

21/06/2017

Uma inversão perigosa de política pública de saúde que compromete trabalhadores e instituições

               

A afirmação de que a saúde pública, leia-se Sistema Único de Saúde – SUS, agoniza enquanto o sistema privado assume seu lugar é impactante, mas não distante de uma realidade cada vez mais comprometedora para a manutenção mínima da saúde da sociedade brasileira, em especial a do Rio Grande do Sul, a qual a Federação dos Empregados em Estabelecimentos de Saúde do Rio Grande do Sul – FEESSERS está vinculada. Estamos vivenciando no Brasil o aviltamento dos direitos sociais, exercido por um governo fruto de um golpe político e descompromissado com os cidadãos em geral. O presidente Michel Temer congelou os gastos em saúde para os próximos 20 anos e com isso, a partir de 2018, o mínimo gasto com Saúde será o valor do ano anterior mais a inflação no período.

 

Desta forma, mais uma vez a iniciativa privada ganhou força e os planos privados de saúde se “atiraram” à caça de novos associados. No entanto, este mesmo mercado está cauteloso, porque em virtude do alto índice de desemprego (12,06% no país e 27,3% no RS), muitas famílias já voltaram ao SUS. Um ciclo infelizmente triste, porque o desmonte proposital do SUS não suportará por muito tempo o inchaço desta migração crescente. E não suportará pela própria falta de política de saúde pública voltada para os interesses coletivos da população.

 

O atual Ministro da Saúde, Ricardo Barros, defende “a criação de um Plano de Saúde mais popular, com acesso a menos serviços do que a cobertura mínima obrigatória, determinada pela ANS – Agência Nacional de Saúde Suplementar, com menor custo para o consumidor e que deverá, ainda, contribuir financeiramente para o SUS”. Isto significa privatizar o sistema universal de saúde e retirar dos brasileiros a condição de se tratarem gratuitamente.

 

No Rio Grande do Sul existem cadastrados mais e três mil estabelecimentos de saúde privados (planos de instituições bancárias, cooperativas de médicos, cooperativas de odontólogos, programas suplementares, clínicas e laboratórios, entre outros). Destacamos alguns dos mais conhecidos disseminados entre a Capital do estado, Porto Alegre e cidades do interior: Unimed,RS Saúde, Centro Clínico de Saúde, Ecosalva, JJ Serviços Médicos, Fundação Getúlio Vargas, Innova Saúde, iSaúde, Bradesco Saúde, SOS Consultas Médicas, Medical, Porto Alegre Clínicas, Boston Medical Group, Clínicas Santo Antônio, SER Clínica Pública.

 

Cabe lembrar, que o atendimento é feito em 75% dos casos por Santas Casas e Hospitais Filantrópicos e, no caso das empresas citadas, estão administrando de forma quarteirizada alguns hospitais filantrópicos e terceirizadas algumas UPAS e POSTOS DE SAÚDE.

 

Toda essa proliferação das instituições privadas ocorre em paralelo ao desmonte das políticas públicas e instituições filantrópicas, como os Hospitais de Santas Casas. No Rio Grande do Sul, a exemplo do governo federal, quando o governador José Ivo Sartori assumiu em 2015, a primeira medida na saúde foi cancelar o programa de incentivo aos hospitais – IHOSP (para obras, compra de equipamentos e modernização da estrutura) e atrasar o pagamento dos repasses financeiros (parte federal e parte estadual).

 

Vale ressaltar, que contribuiu também para o agravamento da situação, a relativamente recente alteração realizada na Lei 8080, de 1990. que trata da organização e funcionamento dos serviços de saúde. A partir de 2015, pela Lei 13.097, a redação adquiriu conteúdo autorizativo de exploração e compra de hospitais em geral e também os filantrópicos - por parte do capital internacional, da seguinte forma:

 

“Art. 23.  É permitida a participação direta ou indireta, inclusive controle, de empresas ou de capital estrangeiro na assistência à saúde nos seguintes casos:    

I - doações de organismos internacionais vinculados à Organização das Nações Unidas, de entidades de cooperação técnica e de financiamento e empréstimos;      

II - pessoas jurídicas destinadas a instalar, operacionalizar ou explorar:      

a) hospital geral, inclusive filantrópico, hospital especializado, policlínica, clínica geral e clínica especializada;

b) ações e pesquisas de planejamento familiar;       

III - serviços de saúde mantidos, sem finalidade lucrativa, por empresas, para atendimento de seus empregados e dependentes, sem qualquer ônus para a seguridade social;

IV - demais casos previstos em legislação específica”.                  

 

Essa alteração permitiu para além da já tradicional entrada de grandes empresas internacionais no setor privado de saúde, a inédita - e forte -  ampliação desta entrada para o setor filantrópico brasileiro, por meio da compra de unidades de saúde e hospitais deste tipo que obviamente perderam a qualificação de entidades beneficentes ou filantrópicas e passaram a serem exploradas comercialmente.

 

O resultado é que em alguns casos no Brasil ocorreu inclusive a compra de hospitais filantrópicos e houve um efeito bola de neve - que incluiu a precarização do trabalho em saúde - profissionais de saúde que carregam as instituições literalmente nas costas, tiveram uma sensível piora nas condições de trabalho. Portanto, a pressão aumentou ainda mais, ocorreram demissões e, no entanto, as metas “de produtividade” continuaram as mesmas, com menor número de trabalhadores.

 

Observa-se a redução nos repasses, os administradores passaram a atrasar os salários (alguns já estavam com pendências contratuais) e a não efetuarem os pagamentos de férias, 13º, FGTS entre outros encargos sociais. Os trabalhadores, por sua vez, passaram enfrentando também o assédio moral constante de chefias e até de colegas em função do acúmulo de trabalho, falta de dimensionamento profissional entre outros fatores.

 

Além disso, as instituições passaram a reduzir o número de leitos e cortar vagas de internação, postos de atendimento, exames de alta complexidade, cirurgias eletivas e até mesmo UTIs neonatais foram fechadas. E, os trabalhadores em saúde, como ficaram em meio a esse turbilhão. Cada vez mais acossados e desequilibrados em suas estruturas pessoais e familiar. No entanto, se mantém firmes e responsáveis na garantia da manutenção do trabalho, para garantirem a vida dos cidadãos.

 

Não faltou mobilização. Ainda assim, o governador do estado do Rio Grande do Sul, José Ivo Sartori, nunca se dignou a receber os trabalhadores e ouvir sobre a crise que os atingiu. Foram realizadas inúmeras reuniões, inclusive com as entidades patronais junto em determinados momentos, criados Fóruns de discussão no âmbito parlamentar, promovidas caminhadas com distribuição de material explicativo, assembleias com indicativo de greve e greve. Nada sensibilizou o governador. Como resultado, hoje, os mais de 100 mil trabalhadores em saúde do estado vivem em estado de insegurança.

 

Todo esse sucateamento dos serviços públicos e filantrópicos faz parte de uma estratégia para levar esses hospitais à privatização, pois mesmo em meio à atual crise econômica e política do Brasil, há interesse de grupos privados internacionais como United Health/Amil e Rede D'or que tem aumentado significativamente seus investimentos no país, diante da perspectiva de redução do Sistema Único de Saúde público e universal.

 

Esse é o triste retrato da saúde no Brasil e no Rio Grande do Sul, com perspectivas nada animadoras para os próximos anos. Mesmo assim, a FEESSERS e os Sindsaúdes filiados se mantêm ao lado dos trabalhadores, cobrando das autoridades, exigindo a manutenção e a garantia dos direitos (pagamento em dia dos salários e dos encargos sociais).

 

 

 

Milton Kempfer é presidente da Federação dos Empregados em Estabelecimentos de Saúde do Rio Grande do Sul – FEESSERS

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